quinta-feira, 16 de julho de 2009

Decididamente, culpado.



"Jornalistas", SIC, 1999
Eu só tinha 9 anos. E eu gostava de escrever, de pesquisar, de descobrir.

Pode não ter sido a força motriz, mas foi, sem dúvida, o início da paixão. Se voltasse a passar, dez anos depois, eu veria com os mesmos olhos de menina apaixonada e sonhadora, e continuaria a dizer que, um dia, quero ser como eles.


sexta-feira, 10 de julho de 2009

Sexta feira, treze.

Tocou. Ela foi a primeira a sair da sala. Já tinha arrumado a caneta azul no estojo e fechado o caderno e o livro de exercícios de Matemática, muito antes da professora o permitir. E os ponteiros do relógio teimavam em não cumprir o seu dever. Ela estava cansada de ouvir falar de estatística e de métodos com nomes estranhos: além de detestar Matemática, sabia que nada disso lhe seria útil. Aquilo que ela realmente precisava não estava naquela sala, nem naquele piso.
Tocou. Levantou-se e sorriu para a companheira de mesa e de todas as horas. Não era preciso dizer mais nada, ambas já se tinham habituado à nova rotina dela.
Enquanto tentava furar entre a multidão ruidosa, passou os dedos pelos caracóis, puxou a camisola cinzenta, aquela que ficava bem com o cinto preto dos brilhantes. Finalmente, conseguiu chegar às escadas e desceu. O coração batia a um ritmo alucinante, como se aquele fosse o primeiro dia. Sorria sozinha com toda a vontade e se achassem que era maluca, estava-se a lixar. Afinal, tudo o que mais importava estava mesmo ali, encostado à porta da sala de Informática. Este ritual repetia-se todas as sextas feiras, no intervalo das dez. Ela descia as escadas e ele, de braços abertos, envolvia-a num abraço protector, cobria-a de beijos e dizia-lhe coisas bonitas ao ouvido, que só ela podia saber. E todas as sextas feiras, no intervalo mais movimentado do dia, não havia mais ninguém naquele corredor. Só ela e ele.
Ela desceu as escadas e sorriu quando o viu encostado na parede, à espera dela. Mas, naquela sexta-feira, não encontrou o abraço protector, não teve direito aos beijos salgados e a única coisa que ele lhe disse ao ouvido foi um amargo “ temos que falar”.
Ela sentiu um arrepio a percorrer-lhe o corpo todo. Algo não estava bem e não era coisa boa a que aí vinha, disso tinha a certeza. Deram as mãos e caminharam juntos, num silêncio sepulcral.
Nuns segundos que pareceram horas, ela fez força e tentou acreditar que ele só lhe ia contar alguma coisa mais grave, mais séria. E que iam ficar juntos para sempre, como tinham prometido. E que aquele ramo não ia murchar, não podia.
Sentaram-se juntos a uma distância tão grande que era impossível tocarem-se. Ele, com um discurso preparado, só conseguiu dizer a primeira frase. Ela, sem verter uma única lágrima, conduziu o resto da conversa. No fundo, estava a concretizar-se aquilo que ela sempre temeu, aquilo que ela nunca quis acreditar que pudesse acontecer. Por isso, rapidamente terminou aquele tormento, não podia ouvir mais. Uma última troca de olhares. O dele de pena e o dela de raiva.
Correu para lugar nenhum, foi contra as pessoas, deu pontapés em caixotes do lixo. E, assumidamente fraca, deixou cair as lágrimas. Tentou acreditar que fosse um pesadelo e que, depois de acordar, correria de novo para os braços dele.
Quando a noite caiu, despiu a camisola cinzenta que ele tanto gostava e chorou. Hoje, lembra-se de ter chorado dias a fio, quase sem parar. A dor no peito era forte, como se estivessem a apertá-la com molas, a picá-la com mil agulhas finas. Mal ela sabia que o pior ainda estava para vir. Aquilo que ele não teve coragem de lhe contar naquele dia.
Que o tempo tudo cura, que tudo passa, que os amores vão e voltam, nisso ela não acreditava. Afinal, um grande amor, por muito que se tente esquecer e se acredite que se esqueceu, dura uma vida. Uma vida inteira.